terça-feira, 19 de outubro de 2010

Depois de uma falha geral da internet, que já ameaçava acontecer desde ontem, tive de fazer tudo aquilo que adiava há umas semanas. Olhar para o computador como se fosse um buraco fechado, fechá-lo e actualizar a resma de jornais. Já tenho um cesto especial para os jornais, é de plástico roxo e dá imenso jeito. Numa metade tenho os que quero guardar por tempo indefinido, recortes de textos que quero - um dia - ler com cuidado, e na outra metade os que ainda não consegui ler. Perante o facto de ter chegado a casa esganada de fome às 19h e ter jantado como se fossem 23h, dei por mim às 20h com todo o tempo livre. Contrariando a tendência dos últimos dias. Lá fora, a temperatura agrava-se e a vontade de sair reduziu-se, depois de um dia quase inteiro na rua. Distribui os jornais em diferentes montes e li-os. Concluo que devem ter redacções enormes porque os jornais de fim-de-semana são espantosamente um aglomerado de suplementos. Home, work, garden, style, travel, education, review, best movies. Para além da revista. Folheei os muitos G2, por vezes também desinteressantes, algo que leva a crer que isso acontece até aos melhores. Recortados os jornais, saltaram para o meu saco de pano beje, do supermercado, o tal que comprei logo nos primeiros dias para entrar no espírito da ida às compras. A verdade é que raramente o uso, porque a decisão da ida às compras não é tomada nunca com muita antecedência. Amanhã levo o meu saco e deixo os jornais na reciclagem, que é aliás um ponto curioso desta cidade. Primeiro, não me parece que muita gente recicle o que quer que seja. Segundo, pagam-se multas se deitarmos o lixo nos caixotes dos outros [o desconhecimento fez com que passasse os primeiros dias a infrigir a lei]. O único ponto de reciclagem está ao fundo de uma das três ruas que, por sorte, até é a minha. Terceiro, achei um caixote para papel aqui perto e penso que é lá que vou deixar os jornais amanhã. Não será de ninguém, concluo desde já. Esse caixote, aliás, fica mesmo ao lado da casa do senhor que arranca com velocidade na sua bicicleta logo pela manhã. Arrisquei a perguntar quem é que ele era, num dia em que falávamos de rosas amarelas e eu me lembrei que em frente à porta da casa de onde ele sai com a sua bicicleta, há um canteiro com enormes rosas amarelas. São bonitas, mas não particularmente, são do tipo de rosas que estão sempre demasiado espapaçadas. Soube então que o senhor tem um historial de vida interessante, filho de um inventor escocês. Curiosamente, lembro-me agora, ontem caminhava para a faculdade com as calças dentro das botas, quando percebi que não estava a funcionar. Parei para as tirar para fora das botas, próxima do canteiro das rosas amarelas, e assisti numa fracção de segundos a uma conversa entre duas pessoas. Uma delas era uma senhora com uns sessenta, ou talvez cinquenta e muitos, nunca consigo distinguir, e o outro era um senhor de bengala (talvez me persigam as bengalas). Só apanhei o momento em que o senhor diz 'Prazer em conhecê-la, eu tenho 94 anos'. A senhora não se mostrou muito admirada, tendo tido o descaramento de lhe responder 'Pois, há um tempo vivia aqui uma senhora com 98'. Segui caminho, ainda que com frio nas pernas, a pensar em como talvez ele pudesse, daqui a quatro anos, voltar ao mesmo sítio e ter a mesma conversa.

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