Foi uma das razões que me fizeram escolher vir para cá. Ir para lá das discussões sobre as dezenas de teorias, lutando contra conceitos e escavando as falhas de cada uma, sem conseguir soluções ou alternativas extraordinariamente eficazes. Ir para lá dos momentos em que, honestamente, dou comigo a olhar pela janela da sala, depois de já ter entendido a teoria, de a termos descascado, a termos aplicado, e continuarem a esventrá-la sem qualquer aplicação concreta na realidade. Abandono a sala e deixo-me seguir pelos meus pensamentos, até me dirigirem uma pergunta e o sangue subir-me à cabeça num segundo. Reconheço a importância das teorias e há um inteiro mundo que eu desconhecia. É possível perceber melhor a realidade, comparar situações, posicionarmo-nos algures nas teorias, criar as nossas próprias teorias, comparando países, culturas, peso das religiões. Sem esquecer como a percepção que se tem do que nos rodeia é tão diferente em cada canto do mundo. Nas discussões nas aulas percebo como por vezes a minha visão está tão longe da pessoa sentada ao meu lado. De como se pode ter um entendimento completamente oposto dos mesmos acontecimentos, reacções e atitudes. De como para um é perfeitamente aceitável que se imponha uma perspectiva externa do mundo, do que é justo, de quais são os direitos humanos, do que deve ser um país, um governo, um sistema. Muitas vezes sem sequer ter parado para pensar que é possível que, do outro lado do mundo, a visão do que é o mundo seja diferente. Outras vezes, tendo plena consciência disso e fazendo-o para sua própria estabilidade.
Mas então chega o momento em que lidamos com a realidade. Parto para Sarajevo no sábado, para analisar os media, a sua organização, influência e obstáculos durante e após a guerra. Partindo da experiência de jornalistas que, também eles, têm a sua visão sobre o que é o jornalismo, qual foi e qual é o seu papel. Jornalistas que viveram o jornalismo de uma forma diferente do que alguma vez eu conseguirei viver, que o tiveram como ponto central e único durante um tempo.
Volto a sentir o prazer das vésperas de partir para um novo país, sem conhecer nada nem ninguém. Com encontros marcados por email com pessoas que por enquanto apenas imagino como são. Fazer e refazer a mala, rever as próximas duas semanas e pensar de que é que posso precisar. Comprar um bloco novo, um pacote de rebuçados (os mais baratos de marca branca do supermercado revelaram-se perfeitos, embrulhados em pedaços de papel branco), juntar os meus papéis todos, rever apontamentos, apontar todos os contactos, saltar aos alfarrabistas e pedir-lhes livros.
E lá vou eu, tentar perceber melhor as pessoas, como se vêem nas suas vidas e nos seus países, naquilo que me sinto mais à vontade para fazer. Aplicando as teorias que entretanto humanizei, tentando humanizar as que me pareceram inúteis e criando as minhas, aprendendo a lidar com o mundo, fora do meu mundo.
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